quarta-feira, 28 de abril de 2010

A BATUTA DO MAESTRO

A BATUTA DO MAESTRO

Dias atrás eu vi na TV Senado, no programa “Conversa de Músico”, o bolero de Ravel numa apresentação da Orquestra Filarmônica de Viena no Palácio de Schönbrunn. A regência era feita por criatura belíssima. A alma toda à mostra. O sorriso, o olhar e as expressões arrebatavam a orquestra que vibrava sob sua batuta. Vez por outra um deles solava e os outros silenciavam. Era um espetáculo de compreensão. Reviveram juntos Ravel e depois Strauss. Confesso que vibrei. O maestro belíssimo, os cabelos feitos em muitas trancinhas que escorriam sobre o terno impecável. Barba e cavanhaque grisalhos preenchiam o sorriso de cadência. Elegância e sutileza de gestos, conduzindo o grupo, e todos juntos arrebatando a platéia que tomava os jardins do palácio. Um grande espetáculo. Diverso, genuíno. Bem humorado. Sem fronteiras ou divisas territoriais, étnicas ou políticas. Sem fronteiras para tocar a alma. Quem conhece talvez saiba de quem estou falando. Um homem-banda, como costumam dizer. Com a voz ele produz algo que não é, senão, poesia pura. A melodia, a linha de baixo por onde a música passeia, o tema, o ritmo – tudo passa por ele e pelo corpo que canta junto. É um nome de peso do jazz contemporâneo. Discos, shows, performances e diversos prêmios. Alguns: melhor performance vocal masculina de jazz por Another Night in Tunisia (1985), Round Midnight (1986), What is this thing called love (1987) e Brothers (1988), melhor arranjo vocal para duas ou mais vozes por Another Night in Tunisia (1985) e melhor gravação para crianças, por The Elephant´s Child (1987). Improvisa sobre obras musicais com genialidade e encanto. E faz essas escolhas, como li num texto da assessoria de comunicação da TCA, “randomicamente” a partir de seu universo de canções. E parece ser mesmo assim. O homem traz em si um universo. Inglês radicado em Nova Iorque, filho de Robert McFerrin, barítono operístico e o primeiro cantor negro de prestígio na ópera. Com a música Don´t worry, be happy, o artista recebeu o Grammy de 1988: música do ano, melhor performance vocal pop masculina e disco do ano. (Recentemente a cantora Mart’nália fez uma preciosidade de trabalho em sua versão para a mesma música: acrescentou a ginga brasileira e uma outra forma de delírio sobre a bela canção). Ele brilha como maestro e compositor. Brilha nas performances e improvisações. E é um engajado porta-voz em prol da educação musical nas escolas. Como disse o The Los Angeles Times, “O maior presente de Bobby McFerrin para seu público talvez seja o fato de transformá-los de espectadores em celebrantes e mudar a sala de concerto em playground, um centro de aldeia, um espaço alegre.” Quem entende diz que ele possui alcance de quatro oitavas. Entender eu não entendo... mas sinto o delírio que ele imprime e que contagia. Explora com propriedade a poesia que há no mundo e faz misturas, alquimias com a imensa variedade que recolhe da vida. Como maestro é outro assombramento. Seja na dança da batuta, em suas expressões, ou no movimento do corpo; ele transporta a música de dentro de si para a orquestra que vibra em sintonia, comunga com o público arrebatado. Nessa apresentação com a Orquestra de Viena os músicos sorriam, captavam, entravam na viagem de descobertas e improvisos de Bobby. Uma surpresa boa que tive. Sei lá quanto tempo passei ouvindo aquilo tudo. Sentindo aquilo reverberar sem pré-conceber ou julgar. Simplesmente me deixando levar pelo entusiasmo dele, por sua entrega visível. Se já escutou, sabe do que estou falando. Mas se não, tente. Escute a regência dele para o Bolero de Ravel, caminhe por aquele “crescendo” hipnotizador. Deixe-se render por esse assombro e depois... Don’t worry, be happy.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

PONTOS DE CULTURA EM SANTA CATARINA

Crônica publicada no Jornal A Notícia de Joinville. caderno ANEXO pag.03 em 08 de abril de 2010.

Olá, leitor. Depois do contato emocionado que tive com diversos Pontos de Cultura espalhados pelo país e vi de perto a teia por onde um grande cordão de cultura viva se estende, volto aqui para falar um pouco mais do programa Cultura Viva do Governo Federal. Fiz uma pesquisa para saber um pouco como isso acontece em Santa Catarina.

Atualmente são em torno de 60 Pontos divididos entre Xanxerê, Vargeão, Passos Maia, Jaguaruna, Fraiburgo, Seara, Campo Erê, Formosa do Sul, Palmitos, Laguna, Joinville, Maravilha, Araquari, Sombrio, Rio do Sul, Penha, Barra Velha, Pinhalzinho, Joaçaba, Canoinhas, Tubarão, Lages, São Francisco do Sul e Florianópolis. Há disponível na internet uma relação dos Pontos conveniados: “Multiplicando Talentos” em Criciúma, “Música no Planalto” em Curitibanos, “Fotografia para Todos” em Blumenau, “Dança Folclórica Alemã” em São Bonifácio, “Formas Animadas” em Itajaí, “Guerreiros do Amanhã” em Braços do Trombudo, “Cultura Solidária” em Fraiburgo, “Consciência Negra” do Vale do Itapocu e muitos outros. Associações de apoio à Criança e ao Adolescente, de apoio aos Idosos, Teatro, Arte Carijó. Isso estabelecido e já em andamento.

E cada um de nós sabe que há muita demanda nesse país tão rico. Parodiando a fala do secretário da Cultura eu diria: vamos desesconder o sul? Tem muita coisa boa por aqui que necessita ampliar-se e cruzar fronteiras. O Brasil não é só São Paulo e Rio de Janeiro. A capital de Santa Catarina não é Curitiba. Há isso e muito mais e certamente muita coisa acontecendo que ainda não foi listada. Isso dá uma dimensão da demanda existente no estado e no país.

O ministro Juca Ferreira esteve em Florianópolis e na ocasião conversou com artistas e produtores no sentido de discutir políticas públicas para o setor e também as demandas existentes. Um círculo de fortalecimento cultural no Brasil. Temos talentos no país – como os do mundo animação, citados pelo Ministro. Talentos que inclusive exportamos para outras partes do mundo. Alegria de viver, inteligência corporal, capacidade de lidar com a diversidade – características que interessam ao mundo todo. A alegria e a força do nosso fazer potencializa nossas ações e temos de tirar proveito disso ao invés de copiar cartilhas e manuais americanos e europeus. Eles mesmos querem aprender conosco. Descobrir de onde extraímos “nosso jeito”. Mas é preciso pensar nesse sistema como algo mais complexo. A institucionalização da cultura com infra-estrutura dada pelo Estado para garantir a continuidade das atividades que se vêm implementando. Sempre lembrando que a coisa deve ocorrer sem paternalismo.

A base deve estar no talento e o apoio é alavanca para tirar da inércia. Há que se trabalhar com parcerias entre os municípios, os estados, a federação e a sociedade civil para expandir e garantir a continuidade desse objetivo. Não é só votar.

Como disse Juca Ferreira, há mecanismos de participação da sociedade que devem ser acionados. Ele coloca que nessa questão da cultura há três dimensões: uma de Cultura enquanto fato simbólico, criando condições para ganho de significado pleno, legitimada; a segunda se refere ao direito de cidadania e acesso à cultura e a terceira é a cultura como economia, a que mais cresce no mundo, não polui, é democrática e não tem no Brasil reconhecimento necessário. E é uma economia que se desenvolveu espontaneamente. Tem potencial. Tem demanda. Tem mercado. Um incentivo à economia da cultura está lançado. Tem muita gente já trabalhando nisso aqui em Santa Catarina. Vamos nos juntar a eles atrás de “desesconder” o potencial catarinense? Vamos acreditar e ter otimismo. E trabalhar. Além de todo o bem inerente, ainda melhoramos nosso sistema imunológico. E tiramos os véus. Por isso o Secretário de Cultura Célio Turino, autor do projeto, fala em potência e afetividade como base do movimento. Porque é um movimento que nasce do povo e é potencializado pelo Município, pelo Estado, pelo País. E aí ninguém segura mais a gente. Somos um.

A roda de prosa “Pontos de Cultura e Gestão compartilhada: um outro mundo possível na gestão cultural” teve espaço em Porto Alegre no Fórum Social Mundial. O Pontão Digital Ganesha, de Santa Catarina, instrumento de promoção de intercâmbio e difusão de cultura brasileira, também participa da ação e tem feito sua parte para a continuidade do projeto e a transformação das ações em política pública permanente. Também a UFSC é um Pontão. Isso é troca. É envolvimento. É o Sul se ampliando. São atuações para um mundo possível. Na costura das diversas redes espalhadas a cultura terá então o poder de transformar e fazer isso de forma sustentada. A partir de agora o Ministério da Cultura deve lançar novos editais. Vamos ficar de olho nisso e nesse movimento? Só temos a ganhar. Nós e o Brasil.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

TEIA 2010 - TAMBORES DIGITAIS

Crônica publicada no Jornal A Notícia de Joinville. caderno ANEXO pag.03 em 01 de abril de 2010.

Caro leitor, depois de meu vôo escalar sobre São Paulo e Brasília, finalmente cheguei em Fortaleza; de onde escrevo para contar as novidades da Teia 2010 – Tambores Digitais.

O Programa Nacional de Cultura, Educação e Cidadania – Cultura Viva é um programa do Ministério da Cultura, do Governo do Brasil, e que de acordo com seu idealizador, Célio Turino, Secretário de Programas e Projetos Culturais, nasce do desejo de desesconder o Brasil, conhecendo fenômenos em ebulição e construindo conceitos que se moldem em contato com a realidade viva. E desesconder é coisa linda, não é? Carrega tudo dentro.

Funciona assim a ideia de Célio, posta em prática na gestão de Gilberto Gil , agora continuada pelo Ministro Juca Ferreira, e que envolve o trabalho de muita gente pra continuar dando frutos por esse Brasil: através de editais cada região vai elegendo as entidades sem fins lucrativos para serem conveniadas como Pontos de Cultura; então, se você tem uma ideia, um trabalho que desenvolve, quer propagar isso e ampliar seu trabalho, há nesse projeto um caminho. Se selecionado, terá apoio para pulverizar seu trabalho, sua luta, sua causa, seu desejo.

Essa parceria entre Estado e sociedade civil é o Ponto de Cultura. Ao lado deles, o Programa Cultura Viva integra ainda: Cultura Digital, Agente Cultura Viva, Interações estéticas, Ação Griô Nacional, Escola Viva e outros. Projetos irmãos que ampliam esse desejo. O entusiasmante é a grande TEIA que se tece em torno de desejos diferenciados, mas que no fundo são um só: difusão e fruição de cultura onde os parceiros são agentes culturais, artistas, professores, militantes e todos que enxergam na cultura um modo e uma filosofia de vida. O desenvolvimento e a aproximação entre os Pontos de Cultura propiciam compartilhamento e troca, onde um Ponto apoia e auxilia outro Ponto; e assim vai se configurando uma rede sem demarcações hierárquicas ou geográficas, onde os contatos ocorrem através de ações pautadas a partir das necessidades e ações locais na busca de sustentabilidade e emancipação. Uma ideia de “menos receitadores e mais educadores”.

Tem muita coisa para falar desse projeto. Muito ainda a se conhecer. Quem quiser maiores informações pode visitar os sites http://culturadigital.br/teia2010/ e http://www.cultura.gov.br/culturaviva/. Aqui importa relatar a importância do feito, a beleza e amplitude da ideia. Como bem colocado por Célio numa coletiva à imprensa, o Cultura Viva é, acima de tudo, potência e afetividade. E na TEIA 2010 isso ficou muito claro: generosidade intelectual e trabalho colaborativo. Todos agentes de um processo, tecendo o grande organismo pulsante que é a Nação, visualizada no cortejo que desfilou pela beira-mar em Fortaleza: um cordão de CULTURA VIVA que atravessou os sentidos dos presentes ecoando em outros que serão levados para casa e ampliando um pouquinho mais essa ideia. Mas, como nem tudo são flores, a coisa é política: demanda envolvimento e comprometimento da sociedade. As administrações mudam e é preciso que se vá além de uma política de Estado.

É preciso transformar o Cultura Viva em política pública permanente para que o germe dessa ideia se propague. Para que efetivamente se construa vivência e modo de fazer de acordo com a diversidade que permeia nosso país. Buscar microsoluções que fortaleçam as redes sociais e sedimentem esse germe que fez e faz disparar tantos corações. É assim que se dará o mergulho para “desesconder” o Brasil e seus talentos, de norte a sul, de leste a oeste e também no meio.

Isso tudo destaca, que entre os diferentes tipos de discursos que podemos localizar no nosso dia-a-dia, a grande ação possível refere-se à ampliação de nossas falas e ações, no sentido não dos indivíduos serem pensados e falados, mas o contrário. Porque quando se cria um saber para além daquilo que é proposto e dado como legítimo, quando se colocam dúvidas e questionamentos sobre saberes e fazeres propostos, abre-se a possibilidade para novas lógicas. Para novos discursos. Criam-se rachaduras por onde podem romper novas falas, vindas de atores sociais até então desconhecidos, que dizem respeito ao saber concreto do cotidiano vivido e trazem a possibilidade de mudança e de novas descobertas. Procure saber mais sobre o projeto.

Em São Francisco do Sul há um Ponto de Cultura. E tem muita gente gravitando em torno dessa ideia germe. Trabalhando por ela. Fazendo acontecer. Porque a ideia morre na praia se não trabalhamos por ela. Vamos “tomar a palavra” e criar fissuras no sólido. Vamos ser agentes desse país tão diverso. É um caminho repleto de contradições e de dificuldades como tempo, dinheiro e principalmente do exercício de participação, mas, ao invés da reclamação vazia, é realmente preciso construir novos saberes, novas práticas e novas consciências que possam gerar ações mais instrumentalizadas. Porque só assim a gente pode mudar de faixa. Só assim a gente rompe com as couraças e introduz o novo. Onde quer que seja e haja vida. É preciso criar fissuras. Daí derivam as ações que nos transformam em agentes, que configuram e modificam nosso “ao redor”. Vamos ser agentes?

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