terça-feira, 26 de julho de 2016

Receita para, aqui, no JAPÃO, em PORTUGAL ou onde seja, CONTER A MESMICE nas TEMPORADAS DE CEREJA

Receita para, aqui, no JAPÃO, em PORTUGAL ou onde seja, CONTER A MESMICE nas TEMPORADAS DE CEREJA



Ele te dá uma cereja. O gosto atinge direto órgãos e glândulas. Passa antes pela língua. O olhar dele é injeção de glicose que você sorve e dissolve na papila já tingida de sabor. 

O líquido te percorre, depurando, fomentando outras reações, enquanto o olho dele te olha. É tudo vermelho enquanto isso; e, enquanto isso, ele enxerga a contradição que você é e fica te variando entre os dedos. Ora um, ora dois, ora cinco. Como saquinhos de veludo ele te varia entre os dedos. Uma a uma as fichas vão te caindo no estômago. Uma a uma você sente a dor. Ouve sinos. Eles balançam e fazem um barulho incomum. É o chão que está ruindo. Em tudo você vê erupção: prazer, medo, susto e alívio. Daqui a pouco tudo vai ser um amontoado de imagens lá longe. 

Ele ri e brinca com os saquinhos de veludo. Você pensa em se prender no sino para não morrer à toa. Balançar e fazer barulho com ele. Depois pegar a corda e se jogar: chegar de olhos arregalados no Japão. Olhando o olhar dele você se dá conta que prefere sua parte em dinheiro - pegar o dinheiro e comprar tudo em cerejas... 

Quando, (mais uma vez) ele estiver te variando entre os dedos, surpreenda-o: 

Esparrame todas as cerejas bem no meio da sala, da cozinha, onde for, e, descalça, devagarzinho, pise em cada uma com a pontinha do pé. Sorria. Esmague uma a uma sob seus pés. E vá rindo do espanto dele. Ria até ele dizer pra você parar. Então pergunte: Que foi meu amor? Você queria as cerejas?

domingo, 24 de julho de 2016

SOBRE FOTOGRAFIAS

http://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/uma-homenagem-aos-fotografos




SOBRE FOTOGRAFIAS

Um moço está sentado na soleira da porta. Cotovelo sobre os joelhos, diz para a moça que sonho como aquele nunca tinha sonhado não. Que nunca, desde os tempos em que saiu de Caruaru, tinha sonhado mais. Antes sim, sonhou sim, muitas vezes. Mas nunca um sonho como aquele. A moça lhe olhava de de soslaio. Mexia a cabeça e me espiava. Olhava bem dentro dos meus olhos. E ele contava o sonho e contava do medo e o medo estampado nele escorria pela calçada, pelas pedras, e caminhava até o bueiro. E então não escorria para dentro. Ficava ali a redundar. 

Da minha soleira eu só espiava. Um tapete de concreto forrava a rua e a cidade. O céu era de numerados cinzas e cobria tudo desde o oeste. Prédios erguiam-se feito arbustos sobre o árido da terra. Espalhadas aqui e acolá, casas. Em nenhum canto cor. Em nenhum canto flor. À esquerda, no fio mais elaborado da sombra que atingia em diagonal o pequeno rosto, uma menina partia formigas entre os dedos. Ao longe um vento redemoinhava em riso e frevo e depois escorria. 



sexta-feira, 22 de julho de 2016

SOBRE QUESTÕES RESPIRATÓRIAS E AMORES INVENTADOS



http://metropolitanafm.uol.com.br/novidades/entretenimento/imagens-incriveis-mostram-a-realidade-das-bailarinas-que-voce-nunca-viu




a talhadeira corta a parede adoecida. corta bolores e cheiros acres. corta a palavra. entre a superfície e o dentro, ecos: onde foi que os olhos engoliram a limalha e a córnea reagiu num sobressalto? onde os olhos captaram a retícula da terra? avermelharam? com um tampão no olho, só emudeço. 
em cada instante, quero vôo e mergulho: (não tenho doença) saco pinça, cureta, alicate, picareta. tudo vale. por exemplo, as unhas, ou ser inquilina do escuro até que (mais uma vez) ele me tire para dançar. nada a fazer se sinto paixões de nascença. entremeios em que os pulmões perdem ar e eu, com a coragem de tudo que faz febre, inspiro e dilato os brônquios. (talvez eu pudesse anfitriar o ar. poderia?). mas não, agora dei de andar discreta de ante-salas. a (des) esperar por ele. se o ar é um caminho a vencer; inalo o tremor que vem junto com o medo. desdobro ante um aroma de flor e ocaso. sob o cantar dalgum pássaro e o seu vôo. hibiscus em flor. gaivotas que sobrevoam o quintal. um choro convulsivo às duas da tarde. ando diversa. permeada de hipóteses atravessadas no claro das horas. depois, irônica; salto do sobressalto, e, com unhas pintadas; danço e rodopio no meio da sala. seja como for, sempre em arterial coreografia.

sexta-feira, 1 de julho de 2016

GRAMÁTICA E DESENLEIO




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GRAMÁTICA E DESENLEIO

experimentei uma vírgula depois de, em frente ao espelho, pronunciar alto: eu te amo. foi a vírgula ou o quê a perguntar: como assim? então experimentei outros parágrafos. neguei e afirmei impressões. em seguida, o ponto final, e o ponto e vírgula, que é uma coisa que garante uma ação futura depois de uma viagem qualquer. pensei em fendas e sinapses. em pontes de eletricidade e informação. em ser arquiteta e mudar o desenho das pontes. diminuir o espaço entre um neurônio e outro. entre eu e você. pensei em títulos e em COISAS PARA DIZER EM TEMPOS DE CÓLERA e A DESPEITO DO AMOR, por exemplo: "entuba. come com farinha. dá tuas voltas. buliu com a onça….engole o choro. cê não é quadrado. cada um no seu quadrado. trouxe o motor ou temos que voltar remando? ué… mas… então…. eu? vixe, menino; quebrou o catulé… ué, bate panela. entuba! se ao menos tivesse nascido do outro lado da ponte…”. não é que tanto desembaraço desatou em visagem? 
voltei ao espelho
e num frêmito, era 
Outra já. você? ué menino… trouxe o motor?

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